sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Samy

Certamente o economista Samy Dana é um dos profissionais mais prestigiados da televisão brasileira.

Professor da conceituada Fundação Getulio Vargas (São Paulo, capital), Samy reúne à esta atuação a de ser comentarista do programa “Conta Corrente" (Globo News), disponibiliza diariamente seus pareceres na Coluna Online “Caro Dinheiro” (UOL), e também se distingue como colunista do Caderno “Mercado”, publicado pela Folha de São Paulo.

O economista é também conhecido pela fala mansa, pausada e direta, pelo semblante sereno, e como não recordar, pelas atitudes pouco ou nada convencionais que contrastam com a severidade habitual dos economistas.

Por exemplo, em Março de 2013, o despachado Samy Dana, vestindo camiseta preta e usando sandálias crocs simpaticamente verdes, apresentou-se no complexo da Fundação Getulio Vargas para ministrar uma aula especial: de música.

Pois é, Doutor em economia e especialista em finanças, Samy Dana naquela manhã de Março dissertou sobre criatividade para futuros administradores e economistas. Tudo no embalo da boa música executada com a colaboração da pianista Silvia Goes.

Sem dúvida alguma o cara é uma figura.

Samy é um dos raros professores de que se tem notícia num país que não consegue ganhar sequer um Prêmio Nobel (em qualquer área que seja), que rompe com o formalismo estéril de uma academia que não sabe a que veio, pouco produz e que ainda por cima se coloca numa torre de marfim.

Diferentemente, Samy Dana é um professor que interage com platéias e audiências, é brincalhão e se destaca em traduzir com singeleza conceitos complexos, que no caso das ciências econômicas, se transformaram em formulações áridas, antipáticas e herméticas, uma narrativa que o público leigo sequer consegue acompanhar.

Esta muralha de incompreensões erguida ao longo das últimas décadas é por sinal, uma das estacas que pavimentaram o ruinoso caminho pelo qual o país chegou ao fundo do poço neste ano de 2016.

Afinal, se ninguém consegue nem ao menos entender o que falam os economistas, como esperar participação para solucionar os problemas complexos da economia brasileira, que, aliás, atingem justamente os bolsos daqueles que não sabem o que está acontecendo e ademais, são obrigados a pagar a dura conta de erros que não cometeram?

Certo é que nada do que foi colocado admite qualquer dissociação com o sagrado rigor conceitual. Já disse alguém, seriedade não é sinônimo de sisudez, assim como alegria não é um atalho para a falta de bom senso.

Neste sentido, o esmero conceitual é a motivação básica do saber sistematizado, o combustível das mudanças essenciais para que as sociedades gratifiquem seus membros com paz, prosperidade e uma vida plena e feliz.

Pois então, como nenhum homem ou mulher deste mundo é onisciente - atributo que a tradição judaico-cristã reserva exclusivamente ao Altíssimo - Samy comete, tal como qualquer outro mortal, erros, deslizes e incorreções.

O que tenho a comentar aconteceu no segundo semestre do ano passado. Numa pausa em que decidi descansar um pouco da elaboração do relatório do meu terceiro Pós Doutorado (PNPD-CAPES, 2014-2015), liguei a televisão.

De pronto, lá estava o afável Samy Dana comentando sobre a gestão econômica da ex-presidente Dilma Rousseff.  

Com muita leveza analisava a absurda dependência brasileira das commodities, fruto de uma política econômica que vitaminou a temerária gestão econômica da Era Lula & Dilma Rousseff, que terminou indo pelos ares no mandato da preposta de Lula, a Senhora Rousseff.

Utilizando sentenças simples, de repente, porém, Samy derrapou numa explicação etimológica. Comentando sobre as commodities, retoricamente expôs o raciocínio que segue:

E o que são as commodities? São os bens básicos do comércio exterior. Commodity vem do inglês common. Isto é: comum”.

Acontece que o que foi dito por Samy é uma bobagem. Pelo jeito, o comentarista recorreu a uma analogia apressada de common, relacionando mecanicamente esta expressão à commodity.

Foi uma bobagem porque commodity simplesmente não provém de common.

Daí que vale a pena tecer um comentário sobre a origem da terminologia, de largo trânsito no jargão dos especialistas em economia.

Note-se que a economia reconhece como commodities todos os produtos in natura - ou seja, pouco ou nada processados industrialmente - obtidos pela agro-pecuária e extração mineral, que podem ser estocados por certo tempo sem perda sensível de qualidade.

Confira-se: esta definição também pode incluir insumos como a água doce em seu sentido amplo, que apenas ocasionalmente são indexados ao conceito. Mas recursos como as águas também constituem commodity, e, diga-se de passagem, das mais cobiçadas neste mundo crescentemente sedento.

Advirta-se que a palavra inglesa commodity - em contestação ao que é dito não só por Samy Dana, mas inclusive pelo público leigo - não procede de common, que neste idioma significa comum, vulgar, habitual ou banal.

Note-se que a palavra commodity entrou em uso coloquial na Grã-Bretanha ao longo do século XV, corruptela do francês commodité, cuja tradução usual é comodidade, facilidade ou conveniência.

Por sua vez, o termo francês tem origem no vernáculo latino commoditas, que significa adequação, conveniência ou vantagem.

Fato óbvio, com certeza a palavra commoditas induziu desdobramentos em termos de significados econômicos: oferecer algo adequado ao cliente, estar de prontidão na hora de oferecer um produto, vender o que oferece facilidade para obter lucro, etc.

Aproveitando a deixa, cabe lembrar que estes significados são uma possível origem das chamadas “lojas de conveniência”, encontradas em postos de gasolina ou outros pontos das cidades, uma espécie de pronto socorro de bens e produtos que nas altas horas da noite, não encontramos em lugar algum.

Seja como for e indo direto ao ponto, Samy fez uma explicação incorreta de um termo que deveria ser apreciado com um apuro muito maior.

A questão das commodities não é brincadeira. O caos econômico hoje existente no país teve por epicentro as ditas commodities. Portanto, o conceito seria merecedor de ponderação mais consistente.

Por definição, Samy Dana poderia ressalvar que uma política econômica baseada em commodities deveria primar pela adequação, conveniência ou vantagem.

Tal como o bom e velho latim nos ensina.

O desafio de ser alegre e lúcido em esclarecer sobre o universo fechado dos conceitos econômicos tem sido enfrentado com muito sucesso por Samy Dana.

Como foi rubricado, o país precisa de mais e não menos professores que satisfaçam o duplo protagonismo em transformar o que é conceito abstrato em significado palpável para a maioria dos cidadãos.

Isto em todas as áreas, disciplinas e campos do conhecimento.

Contudo, neste caso Samy Dana errou: commodity não tem origem em common. Este foi um tropeço banal, inadequado e inconveniente.

Algo que deve ser evitado. Principalmente porque assim se abre caminho para a irresponsabilidade da sisudez.

E de quebra, a desqualificação da seriedade da alegria.


PARA SABER MAIS SOBRE A ECONOMIA BRASILEIRA

THE COLLAPSE OF THE HIGH TECH SLUMS: ILLUSIONS OF THE PRESIDENTIAL ERA LULA & DILMA ROUSSEFF (O COLAPSO DAS FAVELAS HIGH TECH: ILUSÕES DA ERA PRESIDENCIAL LULA & DILMA ROUSSEFF). TEXTO DE LIVRE ACESSO (Free e-book).





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MAURÍCIO WALDMAN é jornalista, antropólogo, pesquisador, editor, consultor ambiental e professor universitário. Autor de 16 livros e de mais de 600 artigos, textos acadêmicos e pareceres de consultoria, Waldman fez três traduções matriciais: Manifesto Eco Modernista (An Eco Modernist Manifesto, Breakthrough Institute), inglês-português (2015), O Ecologismo dos Pobres, de Joan Martínez Alier (2007), do espanhol para o português e Cinquenta Grandes Filósofos, de Diané Collinson (2004), do inglês para o português. Maurício Waldman é graduado em Sociologia (USP (1982), Mestre em Antropologia (USP, 1997), Doutor em Geografia (USP, 2006), Pós Doutor em Geociências (UNICAMP, 2011), Pós Doutor em Relações Internacionais (USP, 2013) e Pós Doutor em Meio Ambiente (PNPD-CAPES, 2015).


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